T R A V E S S I A

Há momentos em que cruzo os portais da solidão e compreendo a dimensão do vazio. Esse instante comporta toda a minha vida e me faz conhecer os limites do possível e do capaz.

Sinto-me profundamente responsável pela coragem de avançar e, também, pela covardia de desistir. De mim, depende o ultrapassar da escuridão, para o que der e vier.

Embora pareça que não existem saídas, que nada vai mudar, que essa é a parte que me cabe; tenho a desfaçatez de erguer a cabeça e, mesmo com olhos marejados de lágrimas, enfrento a dolorosa travessia.

Sou um otimista contumaz, sem dúvida, mas não sou de ferro. E, quando me percebo frágil, reajo, debatendo-me contra as paredes da alma, marcando-as com tinta vermelha de sangue, rabiscando frases com pedidos de socorro.

Nunca sei o que as palavras farão comigo. Despejam-me como que loucas de sede e o papel-parede que as sacie.

Hoje, passei por mais um umbral existencial. Tomei consciência plena de minha condição de solitário, de desacompanhado, de ilha no meio de um incomensurável oceano. Morro aos poucos e a vida se esvai em cada curva, em cada suspiro, sem testemunhas.

Falei e não me ouviram, chorei e não me consolaram, amei e não fui amado ...

Eu mesmo sou a minha outra metade ! E como demorei para aperceber-me dessa realidade.

Não desejo coisa alguma, além de uma folha de papel para desenhar um perfil e, depois, jogá-lo ao vento. Ou, quem sabe, fazer um barquinho e deixá-lo solto num dia de enxurrada ...

Navegar, navegar na Internet das águas, que acabam por misturar-se ao oceano. O mesmo oceano onde sou ilha !!!

Crônica com cara de crise existencial, cheia de imagens de filosofia dos anos sessenta ... Brincadeirinha, gente !!!

De quando em vez, vale a pena uma sacudida na poeira acumulada pela monotonia. Não lhes parece ?