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Tempo, pensamento, libido e energia são solteiros e morrerão assim, mesmo contra nossa vontade.
 
 
 
 
 
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***AMOR EM ESTADO BRUTO***
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
O que é, o que é?
Faz você ter olhos para uma única pessoa,
faz você não precisar mais ficar sozinho,
faz você querer trocar de sobrenome,
faz você querer morar sob o mesmo teto.
Errou. Não é amor.
Todo mundo se pergunta o que é o amor.
 Há quem diga que ele nem existe,
que é na verdade uma necessidade supérflua
criada por um estupendo planejamento de marketing:
desde criança somos condicionados a eleger um príncipe
ou uma princesa e com eles viver até que a morte nos separe.
Assim, a sociedade se organiza,
a economia prospera e o mundo não foge do controle.
O parágrafo anterior responde o primeiro.
Não é amor querer fundir uma vida com outra.
Isso se chama associação: duas pessoas com metas comuns
escolhem viver juntas para executar um projeto único,
que quase sempre é o de construir família.
Absolutamente legítimo, e o amor pode estar incluído no pacote.
Mas não é isso que define o amor.
Seguramente, o amor existe.
Mas, por não termos vontade ou capacidade
para questionar certas convenções estabelecidas,
acreditamos que dar amor a alguém
é entregar a essa pessoa nossa vida.
Não só nosso eu tangível, mas entregar também nosso tempo,
nosso pensamento, nossas fantasias, nossa libido,
nossa energia: tudo aquilo que não se pode pegar com as mãos,
mas se pode tentar capturar através da possessão.
O amor em estado bruto, o amor 100% puro,
o amor desvinculado das regras sociais
é o amor mais absoluto
e o que maior felicidade deveria proporcionar.
Não proporciona porque exigimos que ele
venha com certificado de garantia,
atestado de bons antecedentes
e comprovante de renda e de residência.
Queremos um amor ficha-limpa para que possamos contratá-lo
para um cargo vitalício.
Não nos agrada a idéia de um amor solteiro.
Tratamos rapidamente de comprometê-lo,
não com o nosso amor, mas com nossas projeções.
O amor, na essência, necessita de apenas três aditivos:
correspondência, desejo físico e felicidade.
Se alguém retribui seu sentimento, se o sexo é vigoroso
e se ambos se sentem felizes na companhia um do outro,
nada mais deveria importar.
Por nada, entenda-se:
não deveria importar se outro sente atração por outras pessoas,
se outro gosta de fazer algumas coisas sozinho,
se o outro tem preferências diferentes das suas,
se o outro é mais moço ou mais velho, bonito ou feio,
se vive em outro país ou no mesmo apartamento
e quantas vezes telefona por dia.
Tempo, pensamento, fantasia, libido e energia
são solteiros e morrerão solteiros, mesmo contra nossa vontade.
Não podemos lutar contra a independência das coisas.
Aliança de ouro e demais rituais de matrimônio não nos casam.
O amor é e sempre será autônomo.
Fácil de escrever, bonito de imaginar, porém dificilmente realizável.
Não é assim que estruturamos a sociedade.
Amor se captura, se domestica e se guarda em casa.
Às vezes forçamos sua estada e quase sempre entregamos a ele
os direitos autorais de nossa existência.
Quando o perdemos, sofremos.
Melhor nem pensar na possibilidade de que poderíamos sofrer menos.
 
 
 
 
 
 
 
 
(Autora: Martha Medeiros)
 
 
 
 
 
 
 
 
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Photo Cube




Até onde posso,
vou deixando o melhor de mim.
Se alguém não viu,
foi porque não me sentiu com o coração.


(Clarice Lispector)











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